Para quem é o Setembro Verde?

Imagem quadrada, toda em tom esverdeada. No centro da imagem, há uma pessoa em uma cadeira de rodas. A pessoa está de costas. A imagem está desfocada.

Desde o início dos anos 1980, setembro é considerado o mês de luta das pessoas com deficiência no Brasil pelos movimentos sociais. Ao longo dos anos, a legislação brasileira oficializou várias datas importantes como o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência, comemorado no dia 21 de setembro; o Dia Nacional do Atleta Paralímpico, no dia 22 do mesmo mês; e o dia 27 como o Dia Nacional dos Surdos. Batizado de Setembro Verde em 2015 pela Federação Nacional das Apaes, a cor foi escolhida para representar a ideia de florescimento e esperança.

Em razão destes marcos, anualmente, neste período são percebidas ações nos mais diversos âmbitos, sempre tematizando a luta de alguma forma. Workshops, palestras e feiras são algumas destas realizações. Mesmo que a visibilidade destas datas venha ganhando cada vez mais reconhecimento com os anos, a celebração do Setembro Verde ainda tem pouco destaque na mídia, uma vez que, também neste mês, sob o mesmo nome, dá-se espaço à campanha de doação de órgãos e tecidos. Por isso, observar o comportamento dos meios de comunicação nessas datas pode ser um bom indicador dessa invisibilidade. 

Esta foi a iniciativa desenvolvida no âmbito do Projeto Somos Diversas. Com o auxílio de uma ferramenta de coleta de reportagens em sete portais de notícias online – Agência Brasil, CNN, Correio Braziliense, Folha de São Paulo, G1, O Globo e UOL – mapeamos a cobertura jornalística do Setembro Verde durante todo o mês.

Com uma coleta feita do dia 1º ao dia 31 de setembro de 2024 foi possível perceber que, ao buscarmos pelas palavras-chave “setembro verde”, a maioria das publicações retrata apenas a campanha de incentivo à doação de órgãos, o que confirma um apagamento midiático das campanhas que tematizam a luta da pessoa com deficiência no Brasil. Das 26 reportagens encontradas, apenas quatro tratavam de assuntos ligados à luta da pessoa com deficiência. Este apagamento acaba por enfraquecer ambos os movimentos, uma vez que não encontram na mídia a visibilidade para as demandas destes grupos. A ausência de informações sobre o tema demonstra que a mídia corrobora com a invisibilidade da deficiência na cena pública e com a manutenção de pensamentos sociais que são, muitas vezes, reducionistas e preconceituosos. 

Pensando que um dos motivos para o baixo número de resultados da pesquisa seria uma possível confusão midiática em virtude do termo apresentar significados diferentes, também foram incluídas em nossa busca as palavras-chave “dia da luta da pessoa com deficiência”. Ao todo, foram coletadas 28 reportagens feitas durante o mês de setembro. Dentre todos os sete portais examinados, apenas os sites G1 e Folha de S. Paulo divulgaram reportagens com a temática da deficiência. 

Uma análise mais crítica das notícias revela dados interessantes. As 18 reportagens do portal G1 mencionam o “dia nacional da luta da pessoa com deficiência”. Dessas, apenas três mencionam o “setembro verde”. A maior parte das notícias foi publicada em forma de vídeo e os assuntos abordados variam. As imagens mostradas não são acompanhadas de legenda e, no site onde foram veiculadas, não há nenhum ícone à mostra que torne o conteúdo acessível a pessoas de baixa visão ou surdos. Prevalecem os assuntos relacionados ao mercado de trabalho e às ações sociais que foram desenvolvidas durante o mês. 

A Folha de S. Paulo veiculou dez publicações sobre a temática, sendo apenas uma delas contemplada pelas palavras-chave “setembro verde”. Em sete delas o formato de texto corrido prevalece, enquanto as outras três  foram publicadas em forma de artigo de opinião (formato encontrado apenas nas veiculações da Folha). No site, existe a possibilidade de ouvir o texto da reportagem, mas não há nenhum sinal visível de outro modo de consumir aquele conteúdo (não há interpretação do texto para Libras, por exemplo). Finalmente, a análise dos temas trabalhados mostrou variedade de abordagens quanto à temática da deficiência, mas destacam-se publicações informativas, as quais traziam detalhes sobre as datas comemorativas e sobre as campanhas realizadas. 

A análise das informações obtidas revela que a hierarquização das pautas que serão publicizadas não prioriza a luta das pessoas com deficiência, já que, mesmo em um mês comemorativo, não ocupa um espaço de destaque na mídia. Além disso, temas clássicos como inserção no mercado de trabalho e assistência social continuam como foco das reportagens. Temáticas contemporâneas como direitos humanos, cidadania e capacitismo são praticamente inexistentes. 

 Em geral, o Setembro Verde é mencionado por órgãos de caráter público, tais como prefeituras e secretarias. Nos veículos jornalísticos, entretanto, ainda é desconhecido, o que reflete a pouca mobilização e a invisibilidade em torno do termo. A pergunta que fica é: visto que o movimento de luta das pessoas com deficiência é histórico e tradicional, com mais de cinquenta anos no Brasil, por que o Setembro Verde não pegou?

Pessoa autora

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Isabela da Matta​

Formada em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal de Viçosa, mestranda em Comunicação pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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